sábado, 15 de junho de 2019

“Angueira Atalaia”: Breve Retrato… Grandes Desafios

Por: António Preto Torrão
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Os vestígios dos castros existentes nos montes da “Quecolha” e do “Gago”, sítios do termo de Angueira, evidenciam que o povoamento do seu território antecedeu a dominação romana, que esteve na origem da povoação. Segundo o saudoso Amadeu Ferreira, o topónimo An­gueira remontará aos séculos VI ou VII. Para além de salientar a antiguidade da “capielha de San Miguel”, o insigne mirandês assinala a existência de vários documentos escritos – um dos quais do século XII refere a pertença a Dom Telo Fernandes –, quatro moinhos de água e a doa­ção de terras de Angueira ao mosteiro de Moreyrola, atualmente da Província de Zamora, em Espanha.

Mais recentemente, de 1864, ano em que contava 396 almas, até à atualidade, Angueira foi sofrendo oscilações da sua população: de sentido crescente até 1950, ano em que contava 668 habi­tantes; decrescente, a partir de 1960, mas mais acentuada a partir de 1970. Atualmente, a po­pulação que, permanentemente, reside em Angueira está reduzida a cerca de 80 habitan­tes.

A diminuição da população é consequência da “diáspora”, que, até meados do século passado, foi sobretudo para o Brasil e, a partir dos anos 60, para França. A partir dos anos 70, a saída de jovens para estudar e trabalhar nas cidades e no litoral e a redução da natalidade, que deixou de compensar a saída de migrantes, agravaram ainda mais os, já de si, tão graves efeitos de tal debandada.

Já no século XXI, se a redução da população residente atingiu níveis que ameaçam comprome­ter a própria sobrevivência de Angueira, mais preocupante é ainda a idade dos residentes. Fal­tam, hoje, crianças e jovens que a possam revitalizar e garantir, assim, a sua continuidade.

São vários os problemas que Angueira, uma povoação milenar a que nos prendem os laços familiares, atualmente, defronta. É uma dor de alma assistir ao encerramento da escola, ver dezenas de casas desabitadas, hortas e terras sem cultivo, moinhos em ruína, açudes e “calen­dras” ao abandono. Mas, o que ainda mais dói é vermos tantos familiares, amigos e conheci­dos que nos foram deixando para sempre. Para além de traduzirem o despovoamento e a conse­quente paralisação da atividade económica, tais sinais ilustram também o desacerto das políticas nacional e local: o abandono a que, fazendo jus ao velho aforismo – “Lisboa é a capi­tal e o resto é província!” –, as localida­des do Interior têm sido deixadas.


Apesar de tudo, constata-se que, nunca como atualmente, An­gueira e o concelho de Vimioso dispu­se­ram de condições tão confor­táveis para alber­gar os residen­tes e aco­lher os natu­rais, que se viram força­dos a deixá-la, e os seus descenden­tes, bem ainda os amigos e visitan­tes. Fo­ram e continuam a ser recupe­radas vá­rias casas de habita­ção, boa parte das quais recor­rendo à utiliza­ção de materiais tradicio­nais. Um bom pre­núncio, sem dú­vida. Mas, sendo ainda pouco, é preciso e importa, pois, fazer mais.

Se ficarmos indiferentes, impassíveis ou à espera, Angueira e as mais localida­des do concelho de Vimioso correm o risco de perder a sua identi­dade e, pior que isso, de defi­nhar irre­mediavel­mente. Está nas nossas mãos ajudar a evitá-lo. Revitalizá-las é, pois, o grande desafio que, atualmente, se coloca aos naturais, residentes ou não, e aos seus des­cendentes, espalha­dos por Portu­gal e pelo Mundo, bem ainda aos seus ami­gos. Estou crente de que, irmana­dos neste ideal e aproveitando o que de bom tam­bém nos trouxe a cha­mada aldeia global, cada um e o con­junto dos membros do grupo An­gueira Atalaia, inte­grante do grupo maior A Ata­laia, va­mos dar o melhor de nós, o que poderá ser um inestimá­vel con­tri­buto para afastar tais amea­ças. Da con­fluên­cia de esforços, do estreita­mento de laços e do diálogo entre os mem­bros do grupo de cada uma e das várias localidades que o integram, potenciando siner­gias, para além de servir de ponte, num longo abraço e na recriação ou no estreitamento de laços, entre os naturais e os descendente de outros naturais que, em resultado da “diáspora”, há mais ou menos tempo, se encontram espalhados pelo mundo, há de resul­tar também – pelo menos, esperamos que resulte – a revitalização e o engrandeci­mento das localida­des e do concelho de Vimioso. Contribuiremos, assim, para os conhecer e tornar melho­res e mais apetecíveis para trabalhar, visitar e (con)viver.

Angueira e o concelho de Vimioso precisam e merecem. Vamos a isso!

Um abraço a todos.

Notas:

1) A primeira casa, que era do “tiu Joan Fresco” ou “Joan Ratico”, foi recuperada por Vítor Brancal. A foto foi, gentilmente, cedida por Fátima Malheiro, a quem agradeço a simpatia.

2) A segunda casa, que era do “tiu Ferreiro”, foi recuperada por Emílio Torrão, que, gentil­mente cedeu também a foto. Agradeço-lhe também tal simpatia.

3) Felizmente, há ainda mais casas já recuperadas e outras em recuperação. Porém, não disponho de fotos das mesmas que me permitam reproduzi-las aqui.


António Preto Torrão. Licenciado em Filosofia (Universidade do Porto)
DESE em Administração Escolar (ESE do Porto)
Mestre em Educação – Filosofia da Educação (Universidade do Minho)
Pós-graduado em Inspeção da Educação (Universidade de Aveiro)
Professor e Presidente Conselho Diretivo/Executivo
Orientador de Projetos do DESE em Administração Escolar (ESE do Porto)
Autor de livros e artigos sobre Administração Educativa
Formador Pessoal Docente e Diretores de AE/Escolas
Inspetor e Diretor de Serviços na Delegação Regional/Área Territorial do Norte da IGE/IGEC

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