quinta-feira, 18 de abril de 2019

… quase poema… ou das longas partidas

Por: Fernando Calado
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Ontem os sinos tocaram a finados. Assustamo-nos sempre que se ouve o som lúgubre no campanário da pequena igreja. A aldeia fica de luto. Não é só mais um vizinho que foi descansar depois duma longa e honrada caminhada… é toda a aldeia que paulatinamente está a morrer…
… cada recanto do povoado guarda memórias… a chegada da horta… o carro carregado de feno… o balir do rebanho… os filhos brincando nas eiras… 
…da minha varanda já não vejo os meus vizinhos… um sol poente, lá para os lados da Senhora da Serra, anuncia a vida noutros mundos, noutras paragens...
… estou de luto… de luto pesado … pelos meus vizinhos que durante tantos anos lavraram a terra… colheram os frutos… criaram os filhos… e a aldeia animava-se…
… morrem-me os vizinhos… guardo este silêncio que grita….
… ficam os freixos altaneiros… fica o ribeiro… ficam as hortas… ficam as memórias que carregamos ao colo… e fica esta tristeza imensa em forma de pranto que se ouve no descampado transmontano…
… acendo a candeia de azeite… minha Senhora da boa morte recebe amorosamente os teus filhos…
… esta é a minha prece!


Fernando Calado nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança. 
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.

2 comentários:


  1. Que Texto !...
    Como mexe connosco !...
    E que bom saber que com tanta sensibilidade, foi escrito por um colega do IEFP!!

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  2. Cada texto de um transmontano que versa sobre o êxodo dos moradores e o aniquilamento contínuo e vagaroso das gentes das aldeias,oprimem a mim.Sou brasileiro, neto de portugueses e tenho Portugal como um país a ser visitado, embora a penúria me obriga a apenas sonhar com o evento.Tento participar da vida dos transmontanos, através do blog do Henrique Martins (MOC), o qual já publicou mais cinquenta textos meus.Eu até ousei escrever em Mirandês;o Henrique,solícito e gentil,publicou-os, e até me agradeceu! Nem precisava; eu
    amo vocês todos e seus problemas também tocam a mim.
    Sei que,pelo andar da carruagem, jamis vou conhecer as Terras Altas, que os escritores da terra tanto alardeiam. Mas, aqui do meu recanto, este velho brasuca anseia que melhores dias hão de vir ao povo transmontano.
    Sintam-se todos abraçados.
    Feliz Páscoa.
    Que o amor reine entre vós e nós!

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