segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Dispara número de igrejas não católicas em Portugal

O número de novas igrejas não católicas em Portugal disparou nos últimos anos. Neste momento, há 736 aprovadas pelo Governo, mais 11,1% do que em 2010, segundo dados do Registo Nacional de Pessoas Colectivas Religiosas (RNPCR), tutelado pelo Ministério da Justiça. E muitas outras ficaram pelo caminho.
Aliás, a maioria das novas confissões que tenta instalar-se no país tem sido chumbada pela Comissão de Liberdade Religiosa (CLR). Só nos primeiros sete meses do ano, foram analisados 26 casos, tendo sido recusados 14. E, no ano passado, de um total de 39 processos, 21 não preenchiam os requisitos para serem igrejas.
“São recusados porque não têm identidade própria”, explica ao SOL Saturino Gomes, um dos elementos daquela comissão, admitindo que o número de pedidos de reconhecimento está a aumentar significativamente.
Muitas das recusas resultam também, sabe o SOL, da falta de fiéis e de organização de culto, da ausência de tradição ou do incumprimento das normas religiosas.
Registo só desde 2008
Durante anos, apenas a Igreja Católica era aceite como tal no país, estando todas as outras registadas nas Finanças como associações.
Entretanto, na sequência da Lei da Liberdade Religiosa aprovada em 2001, lançou-se o RNPCR, entidade responsável por aprovar e registar as outras confissões. Apesar de ter sido criado em 2003, só no ano seguinte começaram a ser incluídos os dados. Este registo apenas incluiu as igrejas não católicas, porque o Estado esteve a aguardar a assinatura da Concordata para definir o novo registo para as católicas. “Ainda estamos à espera da legislação”, explicou ao SOL a responsável pelo RNPCR, adiantando que ainda não ficou decidido se vão ser incluídas neste registo ou num outro à parte.
Segundo a lei, sempre que o RNPCR tem dúvidas sobre uma nova igreja, tem de solicitar um parecer à CLR, tornando-se este, no entanto, vinculativo. E só recorrendo aos tribunais é possível revogar a decisão destes dois organismos.
Foi o que aconteceu com a Igreja Igreja Apostólica Católica Ortodoxa. Depois de um parecer negativo e de os tribunais de primeira instância terem continuado a negar a oficialização desta confissão, em 2009, o Tribunal da Relação de Lisboa deu-lhe razão e revogou a decisão da CRL e do RNPCR, exigindo a inscrição imediata no registo. “Éramos reconhecidos desde 1990 e por isso não nos podia ser recusada a integração no novo registo”, explicou ao SOL o padre Jorge, daquela igreja – que em Portugal tem, segundo as suas contas, entre 30 a 40 mil fiéis. Entre as ortodoxas reconhecidas, há ainda as igrejas Grega, o Patriarcado de Moscovo, a Russa e a Romena.
Evangélicos alertam para abusos da Universal e Maná
Segundo este responsável, na base da disputa estiveram questões burocráticas e não questões de conteúdo, como sucede em muitos casos. “Hoje em dia, há igrejas virtuais, apenas com um site e sem espaço de culto”, garante, admitindo que muitas são ‘falsas’ confissões. “Há um ‘limbo’ que ninguém controla”, alerta, referindo-se ao facto de a lei permitir que, quando são recusadas como igreja, se inscrevam como associações.
O mesmo aviso é feito pela Aliança Envangélica Portuguesa (AEP), organismo que agrega 99% das igrejas desta confissão em Portugal.
Ao todo, representam já mais de 1.400 igrejas e organizações, que se dividem pela Convenção das Assembleias de Deus em Portugal, Convenção Baptista, Igrejas Baptistas Independentes, Igreja do Nazareno, Comunhão dos Irmãos, Fraternal, entre outras independentes. De fora deste organismo estão a Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Maná e outras do género. “Recusamos a entrada da Universal e da Maná porque nada têm a ver com as evangélicas. Além disso, não concordamos com a sua praxis e doutrina”, adiantou ao SOL o pastor Jorge Humberto, referindo-se à forma de actuar destes grupos que induzem as pessoas a pensar que certos rituais garantem a obtenção de benefícios de Deus.
“Eles usam o nome evangélico exactamente para confundir os fiéis, mas nada têm a ver connosco”, garante o dirigente da AEP – um organismo com mais de 100 anos que lidera a igreja evangélica em Portugal, a que mais tem crescido no pais e que terá cerca de meio milhão de fiéis.
A religião evangélica já é leccionada em 255 escolas de todo o país e há já 10 capelães evangélicos nos hospitais portugueses. “E estamos a concluir o processo nas Forças Armadas, para que haja capelães evangélicos para os militares”, adianta o líder da AEP.
Apesar do sucesso, o pastor diz ser essencial o Estado apertar a rede às novas formas de culto. “A lei é muito permissiva”, defende, explicando que não há controlo na forma de actuar de muitas associações.
Lisboa e Sintra têm mais cultos
Para Ester Muznik, líder da comunidade israelita e outro dos membros da comissão, o aumento de igrejas está relacionado com o crescimento da imigração: “Tem havido um aumento de religiões, especialmente evangélicas, devido à imigração, sobretudo do Brasil e de África”.
Segundo dados do Registo Nacional de Pessoas Colectivas religiosas, em 2010 estavam registadas 662 entidades, em 2011 eram já 703 e no ano passado 728. Este ano, das 736 que se encontram inscritas em todo o país, a maioria concentra-se em Lisboa (87), Sintra (59), Porto (33), Almada (31), Cascais (30) e Seixal (22). Com menos cultos, surgem Guarda (1), Bragança (2), Viana do Castelo (4), Castelo Branco (5 ) e Évora e Beja (cada uma com 6). E os Açores têm ao todo 11 confissões não católicas.
‘Portugal é um mercado religioso’
Para a socióloga das religiões Helena Vilaça, este aumento de comunidades religiosas deve-se às novas necessidades da modernidade. “Portugal começa a tornar-se um mercado religioso”, explica a especialista, acrescentando que estas religiões “têm uma grande capacidade de adaptação aos tempos actuais”, uma vez que “estão muito atentas às necessidades locais, construindo templos próximos das populações que mais necessitam”.
A socióloga lembra, porém, que, apesar de os últimos censos terem revelado que as minorias religiosas duplicaram, Portugal “continua a ser um país essencialmente católico”.

por Catarina Guerreiro e Sónia Balasteiro
in:sol.pt

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