sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Doença que afecta pinhal mata «a árvore mais rentável da floresta portuguesa»

A doença que desde 1999 está a dizimar pinhais em todo o país continua a alastrar no mapa da floresta nacional. O nemátodo, verme microscópico do grupo das lombrigas, ataca pinheiros e outras resinosas, levando à morte das árvores e consequente perda de competitividade florestal. Vasco Campos, presidente da Federação Nacional das Associações de Produtores Florestais (FNAPF), alerta para a perda económica, ambiental e cultural que advém da praga, referindo que uma das soluções passa pela eliminação de todos os pinheiros em declínio.
Café Portugal - O nemátodo, um verme microscópico, está a matar a floresta de pinheiro bravo em Portugal. Primeiro na faixa litoral a sul de Setúbal e, desde a Primavera de 2008, a zona centro do País no distrito de Coimbra, na região da Lousã e Arganil. Por que razão a progressão da doença é imparável?
Vasco Campos -
Existem várias razões para a rápida progressão desta doença. Em primeiro lugar, esta é a região com maior área contínua de floresta de pinho bravo em Portugal. Área esta que, na sua grande parte, é de monocultura, o que faz com que não hajam barreiras físicas (outras árvores) para a progressão do insecto vector. Em segundo lugar está o abandono florestal. Como se sabe, nesta zona de microfúndio é muito complicado as pessoas apostarem nas suas propriedades florestais e na sua gestão e rentabilidade, pelo que as árvores doentes ficam mais tempo no terreno sem serem retiradas. Isso vai contaminar mais rapidamente outras em volta. Por último, as pessoas nesta região ainda têm o hábito de cortar alguns pinheiros para lenha (assim como ramos) e deixá-los num monte no meio do pinhal de onde os vão tirando conforme a sua necessidade, o que também constitui um grande foco de infecção. Acresce ao facto, a existência de muitas indústrias ligadas à madeira, o que faz com que haja sempre muito pinho a circular nesta região.
C.P. - Quais são os impactos directos na floresta?
V.C. -
Em termos florestais são muitas as consequências e a vários níveis. Em primeiro lugar, temos as consequências económicas, pois o pinheiro bravo é de momento a árvore mais rentável da floresta portuguesa, a mais disseminada no território, inclusive em áreas com declive de montanha, onde mais nenhuma árvore de produção se desenvolve. E até porque nesta região existe muita regeneração natural de pinho, pelo que os produtores apenas têm que conduzir os povoamentos. Depois, existem as consequências ambientais, pois infelizmente a principal alternativa ao pinheiro bravo para os produtores florestais é o eucalipto, espécie que, como se sabe, diminui grandemente os recursos naturais e a biodiversidade (tanto da flora, como da fauna) das suas zonas de produção. As invasoras também terão muito mais área disponível, pois estas avançam muito mais rapidamente do que as nossas espécies nativas em regeneração, o que causará um problema ainda maior do que já temos. Por exemplo, a mimosa, espécie invasora, não tende a invadir pinhais estabilizados. Por outro lado, existem as consequências em torno dos produtos florestais complementares do pinhal, tais como os míscaros e as pinhas, entre outros, que também irão diminuir grandemente. Tal trará um problema também ao nível das tradições, pois as pessoas das regiões onde aqueles produtos se desenvolvem têm o hábito de os apanhar desde há muito.
C.P.
- Em termos de paisagem, quais são os danos mais visíveis, há uma alteração completa do pinhal?
V.C. -
Em termos de paisagem os impactos são muito visíveis, pois surgem árvores secas no meio das verdes, o que numa zona de grandes extensões contínuas de pinheiro salta à vista de imediato. Em zonas mais afectadas, o cenário pode ser idêntico ao de um incêndio, o que nunca é uma visão agradável, muito menos para uma zona com o potencial turístico como é o caso da região Norte. A alteração do pinhal é essencialmente a redução da sua área, com ocupação de outras espécies, nomeadamente invasoras ou em determinados casos a sua completa substituição através da sua reconversão com a introdução de novas espécies florestais, em especial eucalipto.

C.P. - Como se pode combater a progressão da doença?
V.C. -
A doença do nemátodo da madeira do pinheiro não pode ser erradicada, apenas podemos diminuir a rapidez da sua progressão. Para tal, a única forma viável é cortar as árvores com sintomas de declínio, em especial no período de não voo do insecto vector, de Novembro a Abril, e queimar ou estilhaçar todos os sobrantes. Quanto à árvore, deve ser enviada para um centro de tratamento térmico ou, se guardada em casa, deve sê-lo em locais fechados e depois de retirada a casca. Em complementaridade, e se possível, deverão ser colocadas armadilhas para o insecto vector durante o seu período de voo (de Maio a Outubro) de forma a diminuir as populações do mesmo.
«Missão quase impossível»:
C.P.
- Que tipo de apoios existem para minorar a situação?
V.C. -
Os apoios que existem são a dois níveis. Nestes últimos três anos (desde Dezembro de 2008) têm sido executados Planos de Acção de Controlo do Nemátodo da Madeira do Pinheiro através de protocolos entre a Autoridade Florestal Nacional (AFN) e as diversas organizações de produtores florestais. Este ano, com as diversas federações florestais do país, o objectivo principal é o de controlar a dispersão do nemátodo através da eliminação de todos os pinheiros que apresentem sintomas de declínio, consistindo em acções de marcação e eliminação de coníferas hospedeiras com vista à diminuição do número de árvores susceptíveis à doença e à multiplicação das populações do insecto vector. Este plano destina-se a áreas definidas pela AFN, designadamente localizadas em freguesias onde foi identificada a presença de nemátodo da madeira do pinheiro, freguesias envolventes e freguesias da zona tampão (zona de fronteira). Infelizmente estes planos não têm corrido da forma mais eficaz devido a vários constrangimentos, entre os quais a falta de informação e sensibilização da população e económicos. Por outro lado, no Programa de Desenvolvimento Rural do Continente (PRODER) existe uma protecção contra agentes bióticos nocivos, para o controlo do nemátodo com apoio a 100% em áreas definidas pela AFN dirigida aos proprietários florestais onde muitas despesas são elegíveis, desde controlo, análises, monitorização, sensibilização, etc. No entanto, com todos os problemas inerentes ao PRODER actual, uma simples candidatura a esta medida mostra-se uma missão quase impossível.
Ana Clara | quinta-feira, 29 de Setembro de 2011

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