domingo, 31 de maio de 2015

Gustavo Adolfo Bécquer

Gustavo Adolfo Bécquer
Enquanto houver uns olhos que reflectem
outros olhos que os fitam,
enquanto a boca responda a suspirar
aos lábios que suspiram,
enquanto sentir-se possam ao beijar-se
duas almas confundidas,
enquanto exista uma mulher formosa,
haverá poesia!



Se receoso se turba na alta noite
teu peito em flor,
ao sentires um hálito em teus lábios,
abrasador,
lembra-te que invisível ao teu lado
respiro eu.



Hoje sorriem-me a terra e os céus;
sinto no fundo da minha alma o sol;
eu hoje vi-a..., vi-a e ela olhou-me...
Creio hoje em Deus!



Por um olhar, um mundo;
por um sorriso, um céu;
por um beijo...não sei
que te daria eu.



Sobre o regaço tinha
o livro bem aberto;
tocavam em meu rosto
seus caracóis negros.
Não víamos as letras
nem um nem outro, creio;
mas guardávamos ambos
fundo silêncio.
Por quanto tempo? Nem então
pude sabê-lo.
Sei só que não se ouvia mais que o alento,
que apressado escapava
dos lábios secos.
Só sei que nos voltámos
os dois ao mesmo tempo,
os olhos encontraram-se
e ressoou um beijo.



Espreitava em seus olhos uma lágrima,
e em meus lábios uma frase a perdoar;
falou o orgulho, o seu pranto secou,
senti nos lábios essa frase expirar.
Eu vou por um caminho, ela por outro;
mas, ao pensar no amor que nos prendeu,
digo ainda: porque me calei aquele dia?
E ela dirá: porque não chorei eu?



Quando mo vieram contar, senti o frio
de uma lâmina de aço nas entranhas;
apoiei-me no muro e um momento
perdi a consciência de onde estava.
A noite abateu-se em meu espírito;
em ira e piedade afogou-se-me a alma;
e então compreendi porque se chora,
e então compreendi porque se mata!

Passou a noite de sofrimento...a custo;
pude balbuciar breves palavras...
Quem me deu a notícia?...Um bom amigo...
Fazia-me um favor. Rendi-lhe graças.



Deixei a luz a um lado e numa beira
da cama em desalinho me sentei,
sombrio, mudo, os olhos imóveis
cravados na parade.
Que tempo estive assim? Não sei; ao deixar-me
a horrível embriaguez da dor
já expirava a luz, e na varanda
ria o sol.

Não sei tão-pouco em tão terríveis horas
em que pensava ou que passou por mim;
recordo só que chorei e blasfemei
e que naquela noite envelheci.



Levai-me por piedade onde a vertigem
com a razão me arranque a memória.
Por piedade! Tenho medo de ficar
com a minha dor a sós!



Deus meu, tão sozinhos
que ficam os mortos!



É um sonho esta vida,
mas um sonho febril de um instante único.
Quando dele se acorda,
vê-se que tudo é só vaidade e fumo...
Oxalá fosse um sonho
bem profundo e bem longo,
um sonho que durasse até á morte!...
Eu sonharia com o meu e teu amor.


in:astormentas.com

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